sexta-feira, 1 de agosto de 2008

a descomunicação

o senhor presidente fez anunciar ao país uma comunicação importante. apesar do mistério que rodeou a coisa, não era de muita ciência adivinhar o conteúdo do discurso: as autonomias regionais e, sobretudo, o subreptício e disfarçado caso dos Açores.
ao contrário dos teleboçais de serviço, acho que o assunto é sério, importante e, se calhar, assustador. duas regiões de Portugal têm um estatuto à parte, são mais regiões que as outras, têm mais poder que as outras, aqui dispensam a bandeira, ali fecham a porta ao presidente, acolá rodeiam os poderes nacionais de uma teia de rodriguinhos e buroestratégias que consistem em fazer de conta, por meios sinais, que não fazem bem parte do todo, são outra coisa. elas têm uma história comum, falam a mesma língua, comem do mesmo orçamento, mas não são como nós, são outra coisa. são mais portugueses que os outros.
no caso da Madeira, que optou por um estilo folclórico, bonacheirão e paroquial, a coisa, de tão exótica, já se tornou banal. não receber o presidente nacional na assembleia legislativa regional é apenas mais do mesmo. venha o que vier de lá, já não assusta ninguém. se de lá vier a novidade de que na Madeira já só há madeirenses, a nossa primeira reação no Continente vai ser rir a bom rir da última piada. mas os Açores, que têm o lema que devagar devagarinho se vai à Ribeira Grande, já tinham no papo um estatuto que certos países não têm. e aí o presidente assustou-se e quis transmitir o susto aos portugueses.
mas enredou-se num discurso de pequenos poderes e de princípios que mais cheiraram a problema da pessoa ou do cargo do que a um grave problema nacional. em lugar de assustar o país como devia, o senhor presidente pôs o país a encolher os ombros e a dizer ora pôrra.
é claro que os políticos sabem de que perigos fala o senhor presidente. todos os que fizeram parte da orgia da votação unânime do estatuto dos Açores se apressaram a dizer que iriam agora, sobriamente, repensar a coisa.
por mim, não concordo. acho muito bem que se defenda a independência total das regiões. já agora de todas, para não ficarem umas a chorar e outras a rir.
pois é, em Lisboa não se fala claro. não se trata os bois pelos nomes. e fica assim uma coisa que só percebe quem quer.