quinta-feira, 13 de dezembro de 2007

o crepúsculo da Medicina

entende o senhor ministro da saúde que aos médicos não assiste o direito de consciência, tendo em conta o primado das volúveis leis da República. por mim, continuo aferrado ao Juramento de Hipócrates e aos fundamentos da profissão médica. entendo que lei nenhuma da República tem mais força que as minhas convicções morais, éticas, filosóficas e culturais, e muito menos que as motivações que me levaram para esta profissão. se for lei da República a aplicação da pena de morte, senhor ministro da Justiça, senhor ministro da Saúde, não contem comigo. se for lei da República a aplicação da pena de mutilação, da mão, do pé, do braço, dos coisos, do que seja, senhor ministro da Justiça, senhor ministro da Saúde, não contem comigo.
há sempre alguém disposto a cumprir as leis da República. sirvam-se desses.
também é lei da República haver exército, marinha e aviação, instrumentos de uma possível guerra. há os que querem fazer parte e os que se esquivam em nome da objeção de consciência. e está certo. não pode a República violentar a consciência do cidadão. mas esses, já agora não sei porquê, continuam a poder objetar. há sempre alguém disposto e vosselências servem-se.
mas nós, médicos, não temos, no entender de vossa excelência, o direito à repugnância perante certas leis da República. não podemos esquivar-nos a praticar atos que, de acordo com a nossa consciência, são imorais, anti-éticos e anti-profissionais, porque a lei é da República, ponto final e acabou.
pode até acontecer que vossa excelência venha a fazer vencimento na sua pretensão. já não digo nada. já nada me espanta num mundo em que a capacidade de espantar morreu.
mas então deixe de falar de médicos e de medicina. chame-nos mecânicos, robôs, sei lá, uma coisa técnica ou assim. mas médicos é que não.
ou seja, se vossa excelência levar a sua avante, nós estaremos aqui para fazer a vontade do freguês, para consertar, reparar, mexer, mudar, pôr e tirar, remendar, reabilitar ou botar ao lixo. mas não para tratar, para cuidar, para exercer medicina. e já agora, senhor ministro, tire-nos a cultura, a moral, o saber e a consciência. vossa excelência manda, a gente faz. não precisaremos de mais nada que da nossa técnica e das ordens de vossa excelência.
aonde isto chegou, senhor ministro!
quer um aborto, uma eutanásia, uma amputação legal, uma execução assistida? OK, senhor ministro. os mecânicos estão prontos. os médicos-médicos é que não estão.

ps: afinal, de que falam os nossos ministros da saúde quando enchem a boca de ética dos médicos, a torto e a direito?

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